segunda-feira, julho 31, 2006

Meu próximo livro

Vou contar a história das relações de consumo no Brasil, desde 1500 até os dias de hoje. O livro será publicado em março de 2007.

Para o blog, um trecho do capítulo 3:

(...)
Durante o período em que a economia brasileira esteve baseada no sistema mercantilista, simplesmente não havia consciência de que os consumidores eram parte vital do relacionamento comercial. Durante os séculos de monopólio, quem ousaria a defender seus interesses? Qual seria a motivação de fazer valer os direitos de meros compradores? Uma vez insatisfeitos com o único fornecedor disponível, a quem recorreriam?
O ambiente criado pelo poder absolutista e pelo mercantilismo barrou qualquer iniciativa no sentido de aproximar os dois lados. Nos períodos colonial e imperial, a palavra “excelência” era ouvida apenas da boca de quem se dirigia ao rei, revelando uma sociedade que deveria saber louvar quem a “protegia”.
Com a revolução industrial, a relação entre produção e consumo ganhou maior importância no mundo todo, encurtando a distância entre as duas pontas do relacionamento de consumo. No Brasil, porém, graças à falta de ordem para o progresso, traduzida em anos de agricultura de subsistência, escravidão e defesa dos privilégios da aristocracia, os dois lados ainda permaneceriam distantes no século 19.
Em plena era da mecanização da indústria, a elite brasileira era formada por latifundiários, compradores de café, funcionários públicos e doutores. Gente que apenas aprendera a conviver com o comércio, “um mal necessário”, e com os comerciantes, uma espécie de classe média formada por caixeiros, pequenos lojistas e artesãos. Os traficantes de escravos estavam entre as maiores fortunas do País. Na base da pirâmide, junto com pobres e indigentes, estavam os trabalhadores livres. A sociedade agrária considerava o trabalho uma tarefa degradante, atribuição que só poderia ser realizada por uma “sub-raça”. Ganhar dinheiro com o suor do próprio rosto era algo que não se concebia. Tal cultura, associada ao desinteresse em estancar o lucrativo tráfico de escravos, levou o País a fincar os pés na terra, repelindo a mão-de-obra livre e especializada, imprescindível para desencadear o processo de industrialização.

(...)

quarta-feira, julho 19, 2006

Reflexões sobre o Brasil que encanta o cliente


Hoje, navegando na internet, li um artigo intitulado "Satisfação de clientes", escrito pelo administrador de empresas Ricardo de Almeida Prado Xavier, presidente da Manager Assessoria em Recursos Humanos, que faz uma reflexão sobre o tema apresentado em nosso livro "O Brasil que Encanta o Cliente" (Editora Campus).

Fiquei satisfeito ao ler o texto, pois, mais do que destacar os 11 casos de empresas nacionais descritos no livro, o autor do artigo abordou exatamente a mensagem central do livro, que é a de estimular adiministradores e profissionais de marketing e relacionamento a valorizar o legado e o material humano brasileiro em suas estratégias de aproximação com o cliente e os demais públicos que cercam suas organizações.

O link para o artigo completo, escrito em 21 de junho de 2006, é http://www.manager.com.br/reportagem/reportagem.php?id_reportagem=1746

Abaixo, o artigo de Xavier:


Satisfação de clientes


O Brasil é mesmo um país encantador. Não apenas no futebol e nas praias. O mundo dos negócios também está descobrindo aqui uma terra cada vez mais cheia de oportunidades. Parece que aquele brasileiro, famoso pelo jeitinho, continua existindo. Mas tornou o seu jeitinho uma forma de progresso consistente e não mais de improviso que se fundia à esperteza. E o mundo corporativo tem registrado essa melhora das mais diversas formas. Uma delas, que chegou ao nosso conhecimento, é expressa num livro que tem como autores Roberto Meir e Alexandre Volpi (Editora Campus), onde são destacadas histórias de 11 empresas brasileiras - TAM, Telemig, Serasa, Natura, etc. - que são referência no relacionamento com os clientes.

Os autores pontuam suas observações a partir da figura emblemática americana de um advogado, Ralph Nader, precursor dos serviços de defesa do consumidor lá nos Estados Unidos. Dizem os autores que, em suas pesquisas, constataram "não haver almoço grátis na mesa internacional do relacionamento com clientes", lembrando que "as máquinas e o econômico atalho do faça você mesmo começavam a ganhar terreno e a desprezar o valioso contato humano". No Brasil, ao contrário, os autores dizem que descobriram "empresas com predisposição para a excelência nas relações com os clientes". Mais que isso, detectaram nelas "uma habilidade incomum de estabelecer vínculos de encantamento com consumidores, colaboradores, fornecedores, parceiros, acionistas e comunidade".

Nesse aspecto, vale a pena relatar dois episódios que os autores registram, tendo como protagonistas gerentes e clientes da TAM. Num deles, um gerente da empresa, ao constatar que um cliente estava furioso porque um taxista havia cobrado dele um preço exorbitante, devolveu a diferença ao reclamante. Posteriormente, o cliente mandou uma carta ao presidente da TAM devolvendo o dinheiro e elogiando a atitude do gerente. Noutra ocasião, uma cliente ligou para o presidente da TAM e pediu emprestado um dos famosos tapetes vermelhos da empresa. A peça foi cedida e logo devolvida pela cliente, acompanhada de fotos, após o uso como passarela na cerimônia de seu casamento. No Aeroporto Santos Dumont, no Rio, num domingo, uma senhora americana não tinha reais para pagar a taxa de embarque e, ao constatar o problema, um funcionário cedeu o dinheiro à cliente. O caso foi parar na presidência, de onde partiram, claro, elogios ao funcionário, até então um simples despachador de malas.

No Brasil, nota-se que há um grande esforço, por grande número de empresas, para ter marcas identificadas com a clientela. Além da TAM, uma delas, na área de saúde, por exemplo, é o Laboratório Fleury: segundo pesquisa Ibope, de 2004, a empresa é reconhecida como exemplar por 84% dos médicos. Ora, a satisfação do cliente consumidor é notoriamente reflexo da satisfação do cliente colaborador. Onde há funcionários satisfeitos, há, obviamente, clientes satisfeitos. E o Brasil está mudando, para melhor.

Ricardo de Almeida Prado Xavier, administrador de empresas, é presidente da Manager Assessoria em Recursos Humanos.


terça-feira, julho 18, 2006

Experimente o desconforto *

No princípio, o homem criou as organizações. E viu que ficaram boas. Deu-lhes forma e vida. Mas, ao contrário da gênese bíblica, a criação nunca conseguiu se separar de seu criador. Como organismos vivos e dependentes, as organizações espelham o perfil de seus integrantes. E, refletindo a essência humana, têm a qualidade de vida atrelada à capacidade de aprendizado. Aquelas que estacionam no tempo e no conhecimento encurtam suas chances de sobrevivência; mas as que aprendem constantemente podem aspirar a uma vida longa e saudável.

Diante do cenário dinâmico dos negócios e da urgência das transformações pessoais ou organizacionais, o vírus da zona de conforto tornou-se um dos mais perniciosos males do mundo corporativo. Ronda e ataca as organizações – ou os indivíduos que a compõem. Sua forma mais aguda de contágio se manifesta na cultura do “empurrão com a barriga”, espécie de letargia existencial que induz as empresas à complacência com o atraso, o erro e a inércia.

Curiosamente, as empresas que confortavelmente se tornam pioneiras ou líderes de mercado têm, em geral, baixa imunidade contra esse mal. O convite ao conforto já fez gigantes como a IBM deitar nos louros de sua posição dominante nos mainframes top-de-linha e pegar no sono durante a revolução dos computadores pessoais e das redes corporativas. Com seus parques lotados de carros grandes e confortáveis, a indústria de automóveis americana levantou tardiamente para reagir à concorrência japonesa, que ganhou terreno no segmento de veículos menores, mais econômicos, mais ágeis e com maiores recursos tecnológicos. A Xerox, inovadora no negócio de cópias, demorou a perceber que seu monopólio tecnológico havia acabado. Os anos “confortáveis” custaram à companhia não apenas a liderança do negócio, mas o virtual afastamento de um mercado muito maior, o de impressoras inteligentes.

E não adianta chorar o leite derramado. Aliás, a busca de defesas que justifiquem o marasmo estratégico é outro sintoma comum desse mal. Sob o argumento de que “mudar custa caro, traz demasiado sofrimento e acaba por mexer em questões muito sensíveis”, tentativas de mudança são abortadas ao menor sinal de obstáculos. Freqüentemente a impaciência com a aparente demora para a obtenção de resultados leva ao abandono prematuro desses projetos. Outras vezes, a superficialidade com que a mudança é tratada traz a sensação de que “mudar não adianta’’ e realimenta a busca pela zona de conforto.

Apesar de todos esses riscos de aborto, uma de suas principais responsabilidades como executivo é impedir que a sua empresa se entregue à aparente segurança da zona de conforto. Dentro dela, qualquer iniciativa tende a se tornar inócua, ainda que haja liderança, treinamento e processos azeitados de gestão. Prepare-se para conhecer – isto sim – o desconforto, que traz novas perspectivas de mercado e produz dinamismo aos negócios. Afaste a falsa impressão de que as crises não existem. Reconheça que, muitas vezes, elas apenas não se manifestaram, ou simplesmente não foram enfrentadas. Calçar os chinelos para se esquivar de conflitos é o mesmo que ativar uma bomba relógio, cujo pavio encurta na medida em que cresce o conhecimento disponível no mundo. Há quem esteja sendo transformado por esse conhecimento.

A sobrevivência e o crescimento só são possíveis na incômoda dimensão do aprendizado e da reciclagem. Pisar em terreno inóspito e enfrentar o medo e a insegurança são atitudes recomendadas, pois colaboram para descortinar horizontes que, do ponto de vista da zona de conforto, eram invisíveis. Lançar-se contra as crises com esforço e diligência pode trazer resultados inesperados e desdobramentos inimagináveis.

Portanto, prepare-se para o bom combate. O primeiro passo é enxergar limitações e estar pronto para aprender. O segundo é desaprender. Pessoas e organizações que aprendem constantemente são aquelas que têm a habilidade de reciclar conhecimento e motivar as pessoas de um time a entrar num círculo virtuoso de aprendizado. O terceiro passo é estruturar e divulgar de forma criativa essa nova realidade.

Processos participativos de planejamento são um dos instrumentos mais eficazes para estabelecer um ambiente perene de aprendizado contínuo. Permitem que as premissas sobre as quais se assenta o modelo de negócios de uma empresa sejam abertamente questionadas. Promovem a discussão franca desses pressupostos e do que precisa ser mudado. Mais importante, orientam a definição das novas habilidades e competências que uma organização deve adquirir para se adaptar à incessante mudança do ambiente em que opera. Implantado de forma sistemática, o planejamento participativo acaba por reduzir a “dor” do contato com as próprias limitações e cria nos gestores um mecanismo quase intuitivo de questionamento e estruturação de novas formas de agir.

Seja por meio de processos participativos de planejamento, seja por outros instrumentos de capacitação e treinamento, o desafio de uma organização é o de lidar com o medo natural da mudança e assegurar um ambiente de adequação permanente. Em outras palavras, transformar-se numa organização de aprendizado que assegure o crescimento contínuo dos seus integrantes. Para alcançar esse objetivo, talvez seja necessário experimentar o desconforto.

* Paulo Apsan, consultor de estratégia e organização de empresas, é presidente da Apsan Consulting Group (ACG)


Texto: Alexandre Volpi