quarta-feira, junho 13, 2007

Na trilha da humanização

O que nos reserva o futuro na área do relacionamento com clientes? Como resolver o impasse entre a conveniência de automatizar os serviços de atendimento a clientes e a necessidade de personalizar o relacionamento?

Se a regra para a sobrevivência nos negócios é tornar-se íntimo de seus clientes, acredito na estratégia da humanização corporativa, uma espécie de encarnação de atributos humanos pelas empresas. Fala-se muito em fidelidade, transparência, afeto, lealdade etc. Os traços da personalidade humana invadem cada vez mais o mundo dos negócios.

Diante disso, para vencer o paradoxo da convergência digital, é preciso enxergar o mundo com outras lentes, as do ser humano. É preciso reconhecer a importância das pessoas e considerá-la vital para a lucratividade dos negócios. Olhar para fora e para dentro constantemente, corrigindo eventuais desvios de rota. Os seres humanos da empresa, conhecidos como colaboradores ou clientes internos, também são alvo dessa estratégia. Precisam estar satisfeitos e encantados com a empresa. Só assim contaminarão os seres humanos de fora da empresa, conhecidos como clientes ou consumidores.

É preciso demonstrar aos quatro cantos a importância da humanização do atendimento, medindo com freqüência o humor de todos os seres humanos envolvidos, incluindo-os no processo de conquista da lealdade. É gente cuidando de gente, com toda a autonomia necessária para criar vínculos de encantamento entre si.

Tudo isso pode parecer utópico, mas já há empresas dando os primeiros passos nesta direção, pelo menos no discurso. Recebi a notícia de que a Bunge Alimentos vai reestruturar o seu departamento de atendimento a clientes. A mudança inclui a substituição do termo “serviço de atendimento” por “central de relacionamento”. Segundo a empresa, a estratégia é ampliar a interação com seus consumidores por meio da humanização dos serviços. E o objetivo é firmar uma relação de confiança e fidelidade.

A logomarca e o slogan do departamento também sofreram alterações. Com maior destaque nas embalagens dos produtos, a logomarca será representada por um coração e um telefone. A frase “A Bunge ouve você” substitui a anterior “Fale com a Bunge”.


A equipe responsável pelo relacionamento foi ampliada e treinada para atuar de forma pró-ativa em relação às solicitações dos clientes, realizar pesquisas de satisfação e detectar tendências de mercado e do comportamento do consumidor.

Esse é o caminho, mas vamos dar tempo ao tempo para analisar os resultados...

terça-feira, junho 12, 2007

Entender a história do consumo no Brasil é ferramenta de marketing

O portal Mundo do Marketing publicou hoje entrevista sobre o livro "A história do consumo no Brasil". Clique aqui para ler ou acompanhe o texto abaixo:



















Do passado, o futuro do consumo no Brasil


Por Bruno Mello
bruno@mundodomarketing.com.br

Quais serão as tendências de consumo daqui para frente? Achar uma resposta para esta pergunta não é fácil, mas se olharmos para o passado e entendermos como chegamos até aqui já será um grande passo. “A história do consumo no Brasil”, livro de Alexandre Volpi, pode ser o começo. A obra lançada pela editora Campus/Elsevier mostra a formação do mercado interno até a chegada do consumidor ao século XXI.
Hoje, como não estamos mais no período mercantilista, o jornalista e especialista em comportamento do consumidor ressalta que o mais importante é enxergar o mundo com as lentes do cliente. Inovação também é importante, mas “uma empresa que vende um produto inovador e não dá atenção ao consumidor está fadada ao fracasso”, diz Volpi nesta entrevista ao Mundo do Marketing.
Sobre o futuro, as próximas páginas a serem escritas vão depender da Internet e do Celular. Se no século passado a televisão foi a grande aliada da indústria do consumo, a mobilidade do celular combinada à conectividade da internet, à interatividade da TV digital e à facilidade dos meios de pagamentos eletrônicos tem tudo para reescrever a história do consumo no país. Enquanto isso, relacionar-se com o consumidor ainda é um grande desafio.

A história do consumo no Brasil é dividia em diversas fases. Você pode destacar cada uma delas?
Acompanhei a formação do consumidor no Brasil da Colônia até a República. Fiz isso não só para registrar a nossa história sob o ponto de vista da relação de compra e venda de mercadorias e serviços, mas também para fazer uma análise criteriosa dos elementos que formaram a nossa sociedade e assim obter um melhor ângulo de visão das relações de consumo em nosso País. Comecei a contar a história do consumo no Brasil pelo descobrimento, em 1500, porque considerei importante mostrar como foram estabelecidas as bases de nossa organização colonial. Nesse período, o sistema mercantilista e a mentalidade monopolista de comércio influenciaram negativamente as nossas elites, que se apegaram aos privilégios e retardaram ao máximo a formação de nosso mercado interno.

O escambo representou um símbolo de como seriam estabelecidas as relações entre dominadores e dominados ao longo dos mais de cinco séculos de nossa existência. Quando aqui chegaram, os portugueses presentearam os índios com algumas quinquilharias, em troca das quais reivindicaram a exploração da terra. Assim, aproveitaram-se de nossas riquezas durante os ciclos econômicos do pau-brasil, da cana-de-açúcar, da mineração e do café. Nessa fase inicial, os heróis da história do consumo foram os mascates e os tropeiros, que caminharam na contramão das elites brasileiras, ajudando no abastecimento e na formação do mercado interno na colônia. O grande vilão, em contrapartida, foi o sistema escravista, que engessou a nossa economia, barrou a industrialização, fortaleceu a aristocracia rural e abriu feridas sociais que tardariam a ser apagadas.

Enquanto era uma “ilha” de Portugal – do ponto de vista comercial e econômico –, o Brasil anestesiou-se contra as dores desse retrocesso e ainda mostrou ao mundo seu enorme potencial exportador. Após tornar-se independente, ao contrário de outra promissora colônia das Américas (os Estados Unidos), o Brasil não transformou sua riqueza em capital para produção, apenas prosseguiu alimentando os interesses de uma classe dominante que se fartava com a estagnação econômica e fazia fortuna com a mão-de-obra escrava. Em plena fase da industrialização mundial, insistimos na economia da roça. E chafurdamos.

Quando se forma um mercado brasileiro realmente consumidor?
Infelizmente o Brasil insistiu em caminhar na contramão do mundo, alimentando os juros altos, a inflação, a pesada carga tributária, o contrabando, o oligopólio, a concentração de renda, o desdenho pela educação e a ausência de cidadania. A partir da fase republicana é que se forma a sociedade de consumo brasileira, constituída por uma base pobre e com reduzido potencial para o consumo. O Brasil começou a recuperar o tempo perdido após a crise mundial de 1929, na Era Vargas (1930-1945). Na verdade, fomos forçados a nos adequar à nova ordem econômica. A industrialização mundial democratizou a tecnologia dos meios de produção e a oferta foi largamente ampliada. A publicidade surgiu para ajustar a demanda à produção. A urbanização foi iniciada com a chegada dos primeiros fluxos de imigrantes na virada do século 20 e as grandes multinacionais começaram a desembarcar no País.

Com o acirramento da concorrência, o consumidor brasileiro ganhou um pouco mais de importância. A necessidade de aquecer a demanda acendeu os holofotes para a parte frágil da relação de consumo: o comprador. E os direitos desse comprador passaram a ser observados, principalmente nos países em que a indústria encontrava-se num patamar mais evoluído. Alguns casos graves de desrespeito ganharam notoriedade no mundo, como, por exemplo, o escândalo da droga talidomida na década de 50 e a luta travada entre a General Motors e o advogado Ralph Nader, que denunciou a falta de segurança de um dos veículos da montadora na década de 60. A sociedade americana saiu na frente e impôs ao mundo padrões de convivência nas relações de consumo. Entre um escândalo e outro, o presidente Kennedy anunciou em 15 de março de 1962 a Lista de Direitos do Consumidor, assegurando ao consumidor o acesso a informação, a segurança, a escolha e a ser ouvido.

Anos mais tarde o Brasil criou o Código de Defesa do Consumidor.
Nessa área, o Brasil novamente foi reativo. Enquanto as conquistas consumeristas nos Estados Unidos nasciam da atuação da sociedade, os desdobramentos no Brasil eram uma dádiva do governo. Os primeiros Procons surgiram na década de 1970, em pleno regime ditatorial. O Código de Defesa do Consumidor, elaborado após o calor desses acontecimentos, passou a vigorar em 1991, período economicamente delicado para o País, com inflação altíssima e galopante, confisco da poupança e abertura econômica. A lei obrigou o empresário a investir na abertura de um canal eficiente de comunicação com o consumidor, o que era obviamente encarado como custo pelas empresas, e não como fonte de receita.

O consumidor brasileiro só começou a perceber o seu real valor com o fim da inflação. Percebeu que seu prestígio valia mais do que ser alvo de uma simples oferta de um produto inovador ou mais barato. A partir de 1995, ele pôde perceber o valor relativo das mercadorias e tomar as decisões não apenas baseado no preço. A duras penas as empresas perceberam que privilegiar o contato com o consumidor e atender a suas expectativas era a única forma de sobreviver no novo cenário econômico. Hoje as empresas entendem que, para conquistar a sua lealdade, não basta satisfazê-lo, é preciso ir um pouco mais além, ou seja: encantá-lo.

Você diz no livro que muitos produtos que surgiram no século passado trouxeram qualidade de vida ao Brasileiro. Hoje, utilizar certos serviços é, na verdade, uma grande dor de cabeça. O que mudou?
Os produtos que surgiram no século 20 trouxeram qualidade de vida aos consumidores porque foram inovadores. Refiro-me a um período em que o brasileiro trocou o fogão a lenha pelo fogão a gás. As pessoas deixaram o campo e seguiram para as cidades. Os medicamentos evoluíram tremendamente para combater males como cólera, varíola e febre amarela. As grandes vedetes do consumo no Brasil da primeira metade do século passado eram os remédios. Os consumidores também tiveram acesso a papel higiênico, aspirador em pó, telefone, rádio, cinema e televisão. Nos dias de hoje, a inovação – assim como qualidade e preço – já faz parte da regra do jogo. A ênfase está nos serviços e no relacionamento com os clientes, e não no benefício da utilização dos produtos. Uma empresa que vende um produto inovador e não dá atenção ao consumidor está fadada ao fracasso. É uma questão de mudança de foco.

Nos últimos 50 anos, a televisão foi um dos grandes propulsores do consumo em massa. O celular terá a mesma importância para os próximos anos?
A televisão teve influência singular na sociedade de consumo de massa, pois foi o veículo que mais auxiliou a publicidade na difícil tarefa de invadir os domicílios brasileiros. Embora não tenha tido o mesmo impacto da TV sob o ponto de vista do estímulo ao consumo, o celular conseguiu dar um passo além nessa aproximação com o consumidor. Tornou-se um item de uso pessoal, acompanhando o consumidor por onde quer que ele vá. Imagine a importância que este acessório deve assumir no futuro. Será o símbolo da convergência digital. A mobilidade do celular combinada à conectividade da internet, à interatividade da TV digital e à facilidade dos meios de pagamentos eletrônicos é um capítulo ainda a ser escrito na história do consumo no Brasil.

Quando se falava de relacionamento antigamente logo se lembra da caderneta do seu Manoel da Quitanda. Hoje, existem mil e uma formas e ferramentas para fazer relacionamento. Mesmo assim, ainda não se chegaram a um modelo ideal. O que podemos resgatar da história?
No livro, faço um trocadilho com as três primeiras letras do conceito de Costumer Relationship Management (CRM). Digo que as empresas de hoje buscam uma fórmula de “Como Reviver a Mercearia”. Ao trazer este modelo do relacionamento da caderneta ou do fio do bigode para os dias atuais, deve-se considerar que não é tão simples manter a característica da personalização do atendimento em uma economia de escala. O grande equívoco de muitas empresas que adotam estratégias de CRM é tentar sistematizar o relacionamento. O exagero no enfoque tecnológico é um erro recorrente.

Não há como se relacionar de forma única e diferenciada com uma massa de consumidores, muito menos por meio de máquinas ou softwares. É preciso antes incorporar alguns conceitos do relacionamento entre seres humanos na cultura corporativa das empresas. É necessário capacitar os clientes internos para lidar com gente, privilegiando o contato pessoal. O Comandante Rolim, fundador da TAM, dizia que seu objetivo não era ser uma empresa perfeita, e sim ter coragem para assumir os erros e aprimorar seus serviços. O CRM é uma viagem em busca da personalização dos serviços e da conquista da lealdade dos consumidores.

Antes havia fidelidade porque não havia concorrência. O que as empresas devem fazer para ter um cliente fiel nos dias de hoje?
Como não estamos mais no período mercantilista, em que, para eliminar a concorrência, bastava aniquilar o adversário com artilharia de guerra, o mais importante é enxergar o mundo com as lentes do cliente. Reconhecer a sua importância e considerá-lo vital para a lucratividade dos negócios. Saber constantemente quais são as suas expectativas e corrigir as rotas de mercado. Ou seja: após olhar para fora, é preciso olhar para dentro. Os clientes internos devem estar alinhados com essa visão. Portanto, antes é necessário buscar a sua satisfação. Caso contrário, o esforço será em vão.

É preciso contaminar colaboradores e parceiros com a cultura da excelência no relacionamento com clientes. Como? Demonstrando a importância da humanização do atendimento, medindo com freqüência o humor dos colaboradores, incluindo-os no processo de conquista do cliente externo, conferindo-lhes autonomia para encantar o consumidor e dando suporte àqueles que querem aperfeiçoar-se. Se chegar até aí, já será um bom começo.

A criação do mercado de luxo é uma forma da elite se diferenciar dos outros consumidores. Ao mesmo tempo, existe uma movimentação para que as classes C e D consumam mais, pois ela representa uma parcela muito maior da população. Como você analisa este novo cenário?
O mercado de luxo sempre existiu e sempre existirá. Os conceitos e os valores são mutáveis. O movimento que percebemos hoje é uma espécie de massificação desse segmento, prova disso são os shoppings de luxo. A segmentação é uma tendência do mercado em geral. O importante nesse novo cenário é buscar o maior potencial de consumo de cada nicho de mercado. As classes C e D também representam um segmento bem interessante do ponto de vista econômico. Há diversas formas de comércio que buscam atrair este público, ávido a imitar os hábitos de consumo dos mais abastados. O comércio informal é um exemplo disso. Os camelôs representam o acesso das classes mais baixas aos itens de luxo. A Casas Bahia e o crediário são a porta de entrada para o mundo dos móveis e dos eletroeletrônicos.

O século 20 representou um marco em termos de avanços do capitalismo, urbanização e da industrialização. A tecnologia hoje é a grande mola de inúmeras transformações. O que esperar do que vem pela frente?
O futuro nos prepara o que chamo de o paradoxo da convergência digital. Como manter relacionamentos reais e duradouros em um mundo cada vez mais virtual? Como manter o cliente interno motivado em um ambiente competitivo e frio? Como fazer florescer o lado humano das relações em uma economia de escala? A tecnologia facilitará os meios, mas prejudicará os fins. A empresa que souber utilizar a tecnologia a favor do relacionamento estará à frente da concorrência.